31.1.04

diagnóstico fatal

"A menina tem saúde a mais." Disse o médico com pesar. "A continuar assim, isto não vai acabar nada bem."
A mãe chora, aflita, e diz "Mas ela nasceu com laranjas!" enquanto o pai, impaciente, anda TIC TOC como o pêndulo do relógio para um lado e para o outro na sala de espera.
"Só há uma solução - dê-lhe uma colher de gripe antes das refeições durante 15 dias... depois logo se vê." E foi tudo. O doutor fechou a porta e a família desceu o escorrega até à entrada, a chorar e a dizer "Ela nasceu com laranjas..."
Quando viu a receita, o farmacêutico acrescentou comprimidos de sarampo à encomenda "Para tomar um ao lanche..."
Os dias passaram-se. Ao fim de duas semanas a família voltou ao consultório. A menina foi examinada. Com urgência foi chamada uma ambulância - a menina tinha um sopro na unha do pé.

27.1.04

vou

Vou! Com eles, com muitos, com todos, com todos os que v„o.
Vou, sim. Sim ou n„o. Decidi! Vou, sim!
Vou! Para l·, para ali, para aqui, para acol·. Vou!
Vamos todos e voltamos - todos os que v„o.
Custou a decidir. Sim, n„o; vou, n„o vou; talvez, quem sabe; vou?...ou n„o? Vou!
Custou a decidir, mas agora vou, vou, vou!

25.1.04

neve nos parapeitos

Dia 2

Nem amor nos copos, nem neve nos parapeitos.
Chocolate quente nas ch·venas, pÈs quentes junto ao aquecedor. Gelo aos pontapÈs no corredor.
N„o h· neve nos parapeitos, sÛ na parte de cima do frigorÌfico.
Presos dentro de uma nuvem, ninguÈm chega, ninguÈm parte. Amanh„ vou-me embora (porque n„o h· neve nos parapeitos).

24.1.04

licores

Bebi amor por um copo. Um copo pequenino cheio, a transbordar.
Bebi amor por um copo. Um copo cheio e depois mais meio.
Bebi amor por um copo pequenino cheio, a transbordar. Um amor e depois mais meio. Na toalha ficou um cÌrclulo molhado - restos de amor em cÌrculos perfeitos na toalha de papel.
AmÙrrrr com muitos erres e acento circunflexo. Amor lÌquido em copos pequeninos a transbordar de amor ‡ mesa depois do cafÈ.

20.1.04

interrupÁıes

A emiss„o foi interrompida por um e-mail mal enviado que passava a correr jardim acima em frente aos olhos estupefactos de milhares de pessoas.
Rapidamente a polÌcia de e-mails se apressou a aprision·-lo com uma rede especial e a conduzi-lo ao seu verdadeiro destino. Em sussurros ouvia-se "Onde j· se viu?", "N„o acho possÌvel!". Um dos entrevistados anunciou o fim do mundo, agora que os e-mails correm desenfreandos aos olhos de quem quiser ver. "No meu tempo n„o era nada assim!"
Corria o ano de 2004 e o canal de televis„o...o meu.

18.1.04

a valsa dos comboios

Nine-Porto numa hora. Tarde de compras e passeio.
Na Antena3 passa o glorioso Dan˙bio Azul.
Com os campos a fugir do lado de l· do vidro, sinto-me num daqueles filmes sobre comboios que passavam na televis„o p˙blica quando havia erros de transmiss„o.
"Pedimos desculpa pelo incÛmodo, a emiss„o ser· retomada t„o breve quanto possÌvel".

16.1.04

sopas

Sim ou sopas em Janeiro,
Sim ou sopas em Fevereiro,
Sim ou sopas em MarÁo,
Sim ou sopas em Setembro.
Sim ou sopas,
Sim ou n„o.
Fica ou n„o fica?
Sim, n„o, talvez, n„o sei.
Visitem, apareÁam!
Mesmo que...
N„o interessa!
Sim ou sopas em quinze.
Sim ou sopas,
Sim ou n„o.

11.1.04

vinil empoeirado

Estar apaixonada È daquelas coisas que nunca se sabe quando vai acontecer.
N„o d· para prever, porque È inesperado; n„o d· para imaginar, porque È sempre diferente; n„o d· para calcular, porque È bem mais complexo que matem·tica. SÛ tirei cincos a matem·tica atÈ ao 7∫ ano...e isso diz muita coisa.
SÛ h· uma coisa que sei que nunca muda...n„o sei de onde vem, nem porque se lembrou de surgir, mas, ainda eu n„o sei que estou apaixonada e j· comeÁa aquela musiquinha idiota a martelar-me na cabeÁa. "Talvez esteja apaixonada, mas n„o sei se estou. Nunca estive apaixonada, mas ser· que estou. Como È que eu hei-de saber, se ninguÈm me ensinou. Mas desconfio, mas desconfio que estou..." Os Ministars ou os Onda Choc cantam ao longe num vinil antigo coberto de pÛ uma vers„o portuguesa do "You're my heart, you're my soul" dos Modern Talking.
N„o sei porque È que essa m˙sica ficou...de tantas que ouÁo e j· ouvi...mas funciona como uma espÈcie de aviso.
Dantes n„o lhe ligava, achava que era uma lembranÁa da inf‚ncia. MemÛrias antigas a tentar vir ao de cima numa adolescÍncia que reprime o que foi da crianÁa. Agora aceito-a como uma amiga. Um aviso prÈvio que vem quando penso numa pessoa para me dar tempo de voltar atr·s, de ver se seguir em frente È mesmo o que eu quero, ou meramente mais um tiro no escuro.
Apaixonarmo-nos È bom, È eterno e fatal. Dura a vida inteira porque morremos com o fim de cada paix„o. Nesse sentido, o amor È para sempre.
Mas o amor dÛi muitas vezes e raramente morre durante o sono, em paz. O amor morre no campo de batalha, ferido por uma lanÁa sem ninguÈm que lhe acuda.
Por isso a musiquinha idiota se tornou uma amiga. Como um grito de guerra. Raramente d· para evitar a batalha, mas pelo menos n„o me apanham desprotegida.

2.1.04

cartas de amor...

A comer cereais e a ler Alvim. N„o o perfeito anormal, se bem que esse tambÈm...mas o perfeito...n„o sei...
Cartas de amor para amantes anÛnimas.
Hora e meia ou coisa que o valha de leitura ·vida. Devia ter sido mais. Devia ter lido uma carta por dia, pra ir saboreando; como uma caixa de chocolates raros, que quase se estragam de tanto que os poupamos. Mas eu sou gulosa, ent„o li tudo de uma vez.
105 p·ginas de cartas escritas em Times a 11 ou 12. Devia ser menos. Devia ser uma letra muito miudinha para caberem mais cartas nas mesmas p·ginas. Depois vinha uma lupa a acompanhar o livro e n„o era difÌcil ler mesmo em Times 5 ou 6.
TambÈm podia ser uma bÌblia de cartas. Com mensagens de amor e esperanÁa para rom‚nticos incorrigÌveis a precisar de acreditar que isso ainda existe. Isso, esse romantismo de namoro ‡ janela...ou na janela...depende!
Uma bÌblia com uma carta para cada dia do ano. AÌ talvez eu conseguisse ler uma por dia e dar-lhe tempo para escrever mais 365.
N„o sei...a verdade È que uma vez li 500 p·ginas num dia.